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Café, Canela & Chocolate

O site da autora Sofia Serrano. Conversas de uma mãe, que é médica Ginecologista/Obstetra e adora escrever. Com sabor a chocolate.

Café, Canela & Chocolate

O site da autora Sofia Serrano. Conversas de uma mãe, que é médica Ginecologista/Obstetra e adora escrever. Com sabor a chocolate.

Confissões de uma médica #12

Avatar do autor , 11.02.16

"Normal" é uma palavra complicada. Não gosto muito dela.

Normal é o quê? A maioria? O percentil 50? O mais frequente?

A maioria das pessoas acha que se está "normal" então está tudo bem.

É normal passarmos os dias a trabalhar, é normal estarmos cansados, é normal os miúdos serem mal educados. É normal os políticos serem todos muito parecidos e não mudarem praticamente nada na nossa vida em geral, é normal esperarmos horas para sermos atendidos num hospital público.

É normal serem as mães a tratar dos filhos mesmo que trabalhem mais horas que os maridos, é normal que os pais ajudem pouco, é normal que não se conheça os vizinhos, mesmo que moremos no bairro há mais de 10 anos.

É normal que se gastem centenas ou milhares de euros em tecnologia mas não se tenha tempo para parar e respirar, é normal que as crianças passem o tempo a estudar para ter as melhores notas mas não saibam fazer a cama ou pôr a mesa.

Não, definitivamente não gosto do conceito "normal".

Vivemos num mundo cheio de possibilidades, e o mais importante é descobrirmos o nosso modo de sermos felizes.

Pode ser normal os médicos trabalharem mais de 24horas, muitos dias por semana, mal verem os filhos, não terem tempo para os amigos nem para os companheiros. Pode ser normal deixarem os filhos até tarde na escola, inscrevê-los em mil e uma actividades extra curriculares, arranjarem explicadores para ajudar nos TPCs. Terem empregadas para cozinhar e limpar a casa.

Não, definitivamente , eu não sou normal. Sou feliz exatamente por ser diferente. E adoro cada instante.

 

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 imagem daqui

 

 

Não há más mães - um post sobre mamas

Avatar do autor , 15.01.16

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Já perceberam que não sou fundamentalista. Não acho que as coisas tenham de ser pretas ou brancas - o cinzento também é uma cor e não gosto de dizer "eu nunca vou fazer isto". Não sei o que o dia de amanhã me reserva.

Muito se fala de amamentação. Uns porque sim, tem se ser, sob qualquer circunstância, porque é o melhor para a mãe e para o bebé.

Outros porque não, porque já decidiram que ia ser assim e se o biberon existe não vão mudar de ideias.

Parece-me que o mundo é grande o suficiente para todos nós.


E posso-vos contar a minha experiência, no meio disto tudo. Mais uma, como muitas que já leram, que não significa que seja igual à vossa, melhor ou pior - é só a minha, uma partilha entre mães.

Como profissional da área sei, desde o tempo da faculdade, que o leite materno é o ideal para alimentar o bebé. Tive uma fantástica professora de Pediatria, a Dra Leonor Levy, acérrima defensora da amamentação numa altura em que os biberons estavam na moda. Ela mostrou-nos todos os factos e evidências que defendem a amamentação, desde a ligação entre a mãe e o bebé, até ao facto do leite materno ter exactamente as substâncias que eles precisam nos primeiros meses de vida. E explicou-nos como orientar uma pega correcta (o posicionamento da boca do bebé no mamilo, para que a sucção seja a adequada, o bebé não engula ar e o mamilo não fique macerado). E mais uma vez em teoria é tudo muito simples. E parece muito fácil.

Depois, anos mais tarde, quando comecei na especialidade, sempre incentivei a amamentação (porque os benefícios são inegáveis, e às vezes é preciso insistir um bocadinho e não desistir à primeira dificuldade), mas também contactei com situações em que as coisas claramente não estavam a correr bem (como mastites complicadas) e tentei que as mães compreendessem que não eram piores mães se deixassem de amamentar para ficarem bem, que mãe e bebé saudáveis e felizes é o que se quer.

 

Claro que depois vem a minha experiência pessoal - passar pelas coisas dá-nos claramente outra perspectiva.

 

 

Quando é preciso esconder a gravidez

Avatar do autor , 14.01.16

Costumo dizer às futuras mães que todas as gravidezes são diferentes. Até a mesma mulher, cada vez que espera um novo bebé, vai viver esta fase de forma diferente.  É impossível comparar barrigas, sintomas, alterações de humor. A ciência não prevê o que vai acontecer em cada gravidez - pode dar uma probabilidade, mas nunca há certezas de nada. 

Há grávidas tranquilas, grávidas que passam 9 meses a vomitar. Grávidas que brilham, exibindo orgulhosamente a sua barriga, grávidas que se sentem pessimamente naquele novo corpo e só querem que passe depressa.

 

E depois há as gravidezes escondidas.

Aquelas que acontecem sem querer, quando se tem 16 anos.

Quando se vive intensamente o momento, quando as emoções comandam. Quando não se tem coragem para contar aos pais, porque se sente que o mundo perfeito que tinham vai ruir, que se vão desiludir com a menina deles. E por isso, esconde-se o máximo de tempo possível.

Disfarçam-se os enjoos, reprime-se a vontade de comer descontroladamente ou aqueles apetites estranhos, de grávida. Adapta-se a roupa para ninguém notar. Não se fala sobre isso a ninguém, nem à melhor amiga. Não se vai ao médico, para ninguém desconfiar. Nas aulas de educação física finge-se uma dor de barriga, estar com o período, ter febre. E assim vão passando as semanas.

Mas há um momento em que a gravidez escondida se torna real, quando a barriga se torna impossível de esconder. E afinal, por entre lágrimas e alguma revolta, os pais aceitam, e ela fica tranquila. E feliz, porque queria muito aquele bebé, apesar de só ter 16 anos. E no final, tudo corre bem, como nos contos de fadas.

 

E hoje, aqui no consultório, está grávida do segundo filho e lembra-se perfeitamente da primeira gravidez. Lembra-se que foi tão diferente. Agora pode ver com tempo, na ecografia, os pés do seu filho, as mãos, a expressão - e a filha também pode espreitar naquele monitor o seu irmão, a filha que passou quase 40 semanas escondida.

Nesta gravidez, quer ver tudo, saber tudo, contar ao mundo que adora estar grávida, que ama muito os seus filhos.

 

E sim, cada gravidez é única e especial. Inesquecível, corra como correr.

 

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Poder chamar o pediatra a casa: Knok

Avatar do autor , 11.01.16

Esta altura no ano, com frio e chuva, é altura de miúdos doentes. Começam com ranhos e tosses, depois há otites, amigdalites e toda uma série de doenças com nomes mais ou menos complicados. Para quem tem miúdos pequenos, já se sabe que o inverno é uma altura particularmente difícil.

A grande maioria das doenças são coisas virais e pouco graves, mas na verdade, eu gosto sempre da opinião do pediatra. Confesso que não gosto muito de os levar às urgências pelas coisas mais simples, porque tenho sempre a sensação que vão com uma doença e uns dias depois aparece outra, que muito provavelmente apanham na sala de espera - a varicela aqui por casa apareceu assim, fomos ao hospital por uma amigdalite, e na sala de espera apanhou-se varicela...

 

Por isso, achei muito interessante um novo projecto de um grupo de colegas, a Knok, e por isso partilho aqui no blog: uma ideia inovadora, que permite, através de uma app no telemóvel, chamar o pediatra a casa para uma consulta de urgência.

Isto sim, agrada-me: os miúdos são vistos por um especialista, sem precisar de passar horas à espera numa urgência, sem apanhar frio nem outras doenças de outras crianças, e os pais ficam descansados. E é possível ver na app o tempo que o médico vai demorar a chegar.

Mas a Knok não serve só para urgencias, também é possível agendar a consulta de rotina com o pediatra que se escolher - na app podem-se consultar currículos dos vários especialistas, as áreas de interesse e diferenciação e ver as opiniões de quem já foi tratado por esses médicos.

Há muitas outras especialidades disponiveis, desde ortopedia a psiquiatria, passando por medicina geral e familiar - basta consultar na app a especialidade que necessitamos e ver os especialistas disponíveis na nossa zona, e a disponibilidade dos mesmos para uma consulta. A rede de médicos está a crescer em todo o país, já contando com mais de 70 na área do Porto e Lisboa, e em expansão para o sul do país.

Basta instalar a app Knok no Smartphone e ver as disponibilidades de médicos na nossa área. 

Podem saber mais sobre a Knok no site ou na página de facebook  - e se acham uma boa ideia, como eu, deixem um gosto!

 

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Os impossíveis da medicina

Avatar do autor , 06.01.16

Na faculdade de medicina ensinam-nos probabilidades e bioestatística.

Ensinam-nos que há acontecimentos altamente improváveis, mas muitos de nós, médicos, gostamos de dizer "lamento, mas é impossível acontecer". Provavelmente pela sensação de poder, de determos o conhecimento e a verdade.

Mas poucos médicos mantêm este tipo de discurso, porque estatísticas são estatísticas, e pessoas são pessoas. E a vida é uma coisa complexa, que nos vai ensinando a nunca dizer nunca. Porque nunca se sabe.

 

A senhora de 40 anos que entrou no meu consultório disse que não era suposto estar ali, que tudo aquilo era impossível. Tinham-lhe dito, há muitos anos atrás, que era impossível engravidar, por ter as trompas obstruídas. Vários médicos repetiram essa palavra definitiva. Tentou tudo e mais alguma coisa durante 20 anos para ter o tão desejado filho, e depois desistiu.

Pelo meio, teve um cancro na mama, e foi preciso fazer uma cirurgia radical e uma série de outros tratamentos. Ser mãe era uma coisa há muito esquecida.

No meio de uma vida complicada, entrou numa depressao profunda, separou-se, esqueceu-se dos meses, namorou sem pensar em futuro.

Um dia, o impossível aconteceu. Um dia, descobriu que estava grávida do filho impossivel.

Chora ao ouvir o coração do filho impossivel. Do "acidente" impossivel, aos 40 anos, depois de um diagnóstico de infertilidade, de um cancro da mama e de uma depressão. Chora e ri ao mesmo tempo. E diz que mesmo que o pai não o queira, ela vai fazer tudo por este milagre.

Não há impossíveis - nem na medicina, nem na vida. 

 

Que haja sempre esperança. 

 

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Confissões de uma médica #11: o ano velho

Avatar do autor , 29.12.15

Não faço listas de decisões para o ano novo.

Gosto de andar com calma e tranquilidade, saborear os dias sem grandes planos.

Talvez porque a vida nos vai ensinando que cada dia é imprevisível, e que tudo pode acontecer - um dia péssimo pode-se transformar em maravilhoso, um dia que tinha tudo para ser o melhor de sempre pode subitamente tornar-se no pior.

Mas quando começam a chegar os últimos dias do ano, apetece espreitar por cima do ombro para o que passou. E 2015 foi um ano de mudanças, e por isso, não me vou esquecer dele tão rapidamente. 

Foi o ano em que, depois de 10 anos a trabalhar no SNS, a dar muito (quase todo) o meu tempo ao trabalho que eu amo, resolvi tirar a bata gasta do hospital, deixar de passar noites e dias sem descansar para conseguir que nada falhasse, deixar o sítio onde fui interna (onde continuava a ser tratada como interna) e arriscar novos projectos. Abrir as asas. Dar aquele salto de coragem, sem medo, porque a sorte protege os audazes.

Foi o ano em que decidi que queria continuar sempre a amar o que fazia, e por isso decidi mudar. 

Foi o ano em que decidi que precisava de mais tempo para mim, para os meus filhos para a minha família para podermos, todos juntos, ser felizes - e aproveitar a vida, que passa num instante. Em que decidi que precisava, efectivamente, de ser mãe, e não só alguém que os vai levar e buscar à escola, sem tempo para brincar, conversar, cozinhar, ler ou andar de bicicleta na rua.

Foi o ano em que o blog continuou a crescer, ficou mais forte, tornou-se parte integrante da minha vida, aqueceu-me a alma e o coração por me levar a tantas pessoas e as trazer até mim, nesta teia virtual que é a internet.

O ano em que acreditei que um sonho se pode realizar - que se vai realizar, em breve (uma das surpresas para 2016!)

Foi o ano em que levamos os miúdos a acampar, em que fomos à neve, conhecemos o Mickey na Disneyland Paris e viajamos por Portugal em sítios maravilhosos.

Foi o ano em que o meu querido mano mais novo descobriu a CR7, a galáxia mais longínqua e me deixou orgulhosa (e está nomeado para personalidade do ano, a votos aqui).

O ano em que voltamos a descobrir que brincar na rua e conhecer os vizinhos é o melhor do mundo, que comer saudável, escolher alimentos biológicos e não processados ajuda-nos a ser mais saudáveis, que termos tempo para parar e apreciar a vida torna-nos mais felizes.

2015 foi um ano em cheio. 

E apesar de não fazer planos nem listas de resoluções para o ano que aí vem, acredito que 2016 vai estar recheado de coisas boas. Basta querermos ser felizes, e fazermos as escolhas certas.

Que 2016 seja o melhor de sempre.

 

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 Foto: Pau Storch

 

 

 

 

 

 

 

Confissões de uma médica #10

Avatar do autor , 03.12.15

Quando começamos o curso de medicina, respiramos medicina. Nada nos desvia a atenção do nosso caminho. Livros, estetoscópios, exames, histórias clínicas. Passamos todos os instantes a aproveitar tudo o que aquele caminho, que escolhemos e que é árduo, nos proporciona.

Depois, quando nos tornamos médicos, continuamos a aprender todos os dias. E acima de tudo, aprendemos com as pessoas que tratamos, para além de com todas as outras com quem trabalhamos.

De repente, apercebemo-mos que há mais variáveis a entrar na equação da saúde e da doença que não só aquelas que apareciam numa lista, nos livros. Apercebemo-nos que não é suficiente saber de cor e salteado todos os comprimidos adequados para um certo problema, mas que também é fundamental sabermos ouvir e conversar com as pessoas. Constatamos que as consultas não podem ser rigorosamente medidas em minutos estáticos, porque somos todos seres complexos e trazemos conosco meio mundo - e para isso, é preciso disponibilidade do médico, para que as pessoas sejam tratadas como um todo e não como um item de uma lista de uma enciclopédia médica.

 

 

 

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Confissões de uma médica #9

Avatar do autor , 19.11.15

Sou boa no inglês, desenrasco-me com o francês, dou uns toques de espanhol.

Apercebi-me, quando vim morar para o sul, que precisava mesmo saber muitas línguas, porque todos os dias há grávidas de nacionalidades diferentes que precisam de um obstetra. É fantástico conhecer grávidas do Egipto, do Nepal, da Ucrânia e de El Salvador no mesmo dia. As grávidas da Guiné trazem uma espécie de cinto protector da gravidez, as holandesas querem tudo o mais natural possível.

Eu faço a minha parte de médica, mas acima de tudo, aprendo muito com elas, e com os seus costumes.
E nos casos em que a única maneira de comunicar é, literalmente, chinês (como me aconteceu hoje!), a solução é mesmo ir ao Google translator e passar a ser também fluente em mandarim (pelo menos, com um computador por perto!).


Depois, é preciso atravessar a barreira linguística e cultural, e encontrar a linguagem comum: o som do bater do coração do bebé é a linguagem universal do amor. Todas as grávidas percebem que aquele barulho ritmado é o coração do seu bebé, e este é o som que tranquiliza qualquer nacionalidade.

 

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